Olá Vítor, Tu és um amor e deixas aqui informação preciosa.
Eu já andava atrás dessa História de José Carpinteiro.
Agora quanto ao demo e natividade eu acho que é uma modificação de uma tradição de se representar o demo, disfarçado de velho peregrino, com um bastão na mão, fazendo José duvidar da virtude a Virgem. Geralmente a cena é representada afastada da cabana, com José ensimesmado.
Só que neste caso é mesmo o chifrudo, sem sequer se disfarçar e está tudo ao molho “:O)) De qualquer forma também não sei de onde vem o relato. Costuma arrumar-se o caso com os “apócrifos”.
AS: No, getting out of a cinema with a girlfriend… 😉
Olá, zazie
Bem, a malta foi folhear os apócrifos e não encontrou o tal relato da presença demoníaca na natalidade, nem no que a classificação clássica dos exegetas chama evangelhos arcaicos (textos contemporâneos ou perto disso, dos canónicos, e que na sua maioria são o que os canónicos são na sua origem: textos litúrgicos e catequéticos de comunidades cristãs) nem nos evangelhos de ficção (evangelhos com diversas datas que preenchem os hiatos dos canónicos, género infância de Jesus, vida de Maria, de José… O presépio do menino Francisco de Assis, por exemplo é baseado no Protoevangelho de Tiago, assim como muitos elementos da mariologia…) Que te tenham dito que se trata dum elemento dum evangelho gnóstico (é possível, eu é que não encontrei nada na minha busca diletante) poderá dever-se á acusação típica dos gnósticos malignizarem a natureza (criada por um demiurgo), típica também do maniqueísmo. Passa-se que nada disto é assim tão preto no branco, claro… Pode também dar-se o caso de ser um relato medieval.
Voilà.
Mas já que andei em passeios diagonais, aqui vão dois pedaços do passeio relativos à natividade, não gnósticos (estes não são narrativos, e não se referem nem a incarnação, crucificação, etc; constituem mais catequeses teológicas):
“Ora, eu, José, passeava-me e não me passeava. E ergui os olhos para a abóboda celeste e vi-a imóvel, e olhei para o ar e vi-o imobilizado pelo espanto. E os pássaros estavam parados em pleno voo. E baixei os meus olhos para a terra e vi um prato e trabalhadores estendidos para a refeição e as suas mãos imóveis no prato. E os que mastigavam não mastigavam e os que tomavam alimento não o tomavam. Todas as faces e olhares estavam erguidos para as alturas. E subitamente, a vida retomou o seu curso. E vi uma mulher que descia da montanha e que me interpelou: “Oh, homem, onde vais tu?” Eu respondi: “Vou procurar uma sábia-mulher judia. – És tu de Israel? perguntou-me ainda ela – Sim” respondi-lhe. Ela continuou: “E quem está a dar à luz na gruta?” E eu respondi-lhe: “É a minha noiva. – Não é então tua mulher?” perguntou ela. E eu disse-lhe: “É Maria, a que foi educada no templo do Senhor. Fui designado para casar com ela, mas não é minha mulher, e concebeu pelo Espírito Santo.” (Protoevangelho de Tiago, datado do II séc.)
“Ora, no ano quatorze da sua idade, eu vim pela minha própria vontade, e entrei nela, eu, Jesus, vossa vida. E estando ela grávida de três meses, o cândido José voltou do lugar longínquo onde exercia o seu mister de carpinteiro. Encontrou grávida a minha mãe, a Virgem. (…) E minha mãe Maria deu-me à luz, numa estrada de regresso a Belém, no túmulo de Raquel, mulher de Jacob o patriarca, que foi a mãe de José e de Benjamim.”” (História de José o carpinteiro, datado do IV século)
E já agora, note-se que as datações referem-se exegeta e fisicamente aos manuscritos, e não correspondem obrigatoriamente a quando se contava tais histórias ou se pensavam tais teologias… aliás a noção de texto fixo ou escrito, e relação com ele, o seu estatuto, é extremamente variável de época e lugar para época e lugar.
Olá Vítor,
Tu és um amor e deixas aqui informação preciosa.
Eu já andava atrás dessa História de José Carpinteiro.
Agora quanto ao demo e natividade eu acho que é uma modificação de uma tradição de se representar o demo, disfarçado de velho peregrino, com um bastão na mão, fazendo José duvidar da virtude a Virgem. Geralmente a cena é representada afastada da cabana, com José ensimesmado.
Só que neste caso é mesmo o chifrudo, sem sequer se disfarçar e está tudo ao molho
“:O))
De qualquer forma também não sei de onde vem o relato. Costuma arrumar-se o caso com os “apócrifos”.
Uma grande beijoca e muito obrigada.
AS: No, getting out of a cinema with a girlfriend… 😉
Olá, zazie
Bem, a malta foi folhear os apócrifos e não encontrou o tal relato da presença demoníaca na natalidade, nem no que a classificação clássica dos exegetas chama evangelhos arcaicos (textos contemporâneos ou perto disso, dos canónicos, e que na sua maioria são o que os canónicos são na sua origem: textos litúrgicos e catequéticos de comunidades cristãs) nem nos evangelhos de ficção (evangelhos com diversas datas que preenchem os hiatos dos canónicos, género infância de Jesus, vida de Maria, de José… O presépio do menino Francisco de Assis, por exemplo é baseado no Protoevangelho de Tiago, assim como muitos elementos da mariologia…) Que te tenham dito que se trata dum elemento dum evangelho gnóstico (é possível, eu é que não encontrei nada na minha busca diletante) poderá dever-se á acusação típica dos gnósticos malignizarem a natureza (criada por um demiurgo), típica também do maniqueísmo. Passa-se que nada disto é assim tão preto no branco, claro… Pode também dar-se o caso de ser um relato medieval.
Voilà.
Mas já que andei em passeios diagonais, aqui vão dois pedaços do passeio relativos à natividade, não gnósticos (estes não são narrativos, e não se referem nem a incarnação, crucificação, etc; constituem mais catequeses teológicas):
“Ora, eu, José, passeava-me e não me passeava. E ergui os olhos para a abóboda celeste e vi-a imóvel, e olhei para o ar e vi-o imobilizado pelo espanto. E os pássaros estavam parados em pleno voo. E baixei os meus olhos para a terra e vi um prato e trabalhadores estendidos para a refeição e as suas mãos imóveis no prato. E os que mastigavam não mastigavam e os que tomavam alimento não o tomavam. Todas as faces e olhares estavam erguidos para as alturas.
E subitamente, a vida retomou o seu curso.
E vi uma mulher que descia da montanha e que me interpelou: “Oh, homem, onde vais tu?” Eu respondi: “Vou procurar uma sábia-mulher judia. – És tu de Israel? perguntou-me ainda ela – Sim” respondi-lhe. Ela continuou: “E quem está a dar à luz na gruta?”
E eu respondi-lhe: “É a minha noiva. – Não é então tua mulher?” perguntou ela. E eu disse-lhe: “É Maria, a que foi educada no templo do Senhor. Fui designado para casar com ela, mas não é minha mulher, e concebeu pelo Espírito Santo.”
(Protoevangelho de Tiago, datado do II séc.)
“Ora, no ano quatorze da sua idade, eu vim pela minha própria vontade, e entrei nela, eu, Jesus, vossa vida. E estando ela grávida de três meses, o cândido José voltou do lugar longínquo onde exercia o seu mister de carpinteiro. Encontrou grávida a minha mãe, a Virgem.
(…)
E minha mãe Maria deu-me à luz, numa estrada de regresso a Belém, no túmulo de Raquel, mulher de Jacob o patriarca, que foi a mãe de José e de Benjamim.””
(História de José o carpinteiro, datado do IV século)
E já agora, note-se que as datações referem-se exegeta e fisicamente aos manuscritos, e não correspondem obrigatoriamente a quando se contava tais histórias ou se pensavam tais teologias… aliás a noção de texto fixo ou escrito, e relação com ele, o seu estatuto, é extremamente variável de época e lugar para época e lugar.
bjocas, Antígona