Tem havido algum alarido no Cocanha, à custa do crocodilo, ali mais abaixo. Não há nada de especial no caso. Os crocodilos sempre se usaram assim: pendurados de vigas do tecto.
O motivo também não parece tão complicado. Desde o Egipto que o deus Sobek tinha enormes poderes, incluindo o benefício da fertilidade feminina por interposto consorte.
Por outro lado, dizia-se que os excrementos do animal tanto podiam ser usados como contraceptivo, como cosmética que restituía a juventude perdida. É claro que a forma de os usar não era propriamente a mesma, mas ainda assim parece que não faltaram velhas e novas para testar os efeitos.

Yaga Baba prepara-se para combater o crocodilo! com um pilão e um macaco e por baixo de um arbusto tem um copo de vinho

gravura popular russa [Satirical Lubok]


Na Idade Média tendia-se a confundi-los com os dragões, que apesar de esquivos até eram animais mais importantes e mencionados na Bíblia.
Por esse motivo e outros possivelmente menos confessáveis (como o mero gosto de mostrar bizarrias) por efeito das navegações, passou a ser mais ou menos moda pendurá-los do tecto das Igrejas.
Por cá também os houve, nesta posição que tanto estranhou alguns leitores do Cocanha e um dia destes falo do assunto, apresentando outras provas.
Adiante-se que o viajante alemão Jerónimo Munzer os localizou no coro do mosteiro da Santíssima Trindade e dos frades menores, frente ao Limoeiro, quando visitou a corte de D. João II, no ano de 1495.

Por agora, fica aqui um dos bicharocos, colocado em meados de quinhentos em plena nave do Santuário de Santa Maria de Le Grazie, na Itália.
A tendência para a laicização crocodiliana também não se fez esperar muito. Das igrejas transitam directamente para os gabinetes de curiosidades da ciência. Com a mudança, o status também se vai. Nas igrejas eram tomados pelo Dragão do Apocalipse ou por ex-votos e não faltava quem lhes fizesse preces. Nos gabinetes, em passando a moda das transmutações alquimistas, acabam os dias como velhos bibelôs empalhados.

É claro que, por portas travessas, também houve excepções…
E mais não digo…

gravura-Ferrante Imperato (1550-1625) Dell’historia naturale . . . Napoles: C. Vitale, 1599

consultar: Jerónimo Munzer, Viaje por Espana y Portugal, 1494-1495, Madrid, Colección Almenara, s.d.

Antónimo,

Já desconfiava dessa tese mas não vou perguntar mais. Sou mesmo demasiado curiosa para querer saber. Prefiro mistérios.

Quanto ao blogue entendo-o perfeitamente. Eu andei no David Lynch e depois fui dar ao Pastilhas e durante muito tempo recusei-me a ter blogue. Na verdade sempre me recusei, até criei uma treta em formato de página do sapo, que era a União dos Comentadores Livres da Blogosfera. Cada um escrevia o que queria em pé de igualdade. Não havia postes, só comentários. Bem, escrevia o que queria não é bem assim que tínhamos o musaranho coxo como porteiro para barrar entradas, pôr na rua e limpar a casa.

Depois fui parar ao Janela Indiscreta por convite. E durante muito tempo até estive numa categoria à parte- a de “colaboradora externa” eeheh

E aqui o Cocanha ja´explquei. Não era para ser blogue. Foi apenas coca-bichinhos de manias de fazer um template catita. Só quando uns amigos me perguntaram para que efeito é que dei conta da anormalidade. Depois fiquei com o link agarrado e continuei nos comentários por aí, e ia deixando, sem saber, o link. Só comecei a estranhar quando recebo mails a darem os parabéns…

E foi assim, fiquei com um blogue às costas por manias estéticas. Houve alturas em que me apeteceu apagar por achar que era uma grande pedantice narcisista. Agora não ligo. Não tenho sitemeter precisamente para não ligar à plateia. Mas sabe-me muito bem estas pequenas cumplicidades e brincadeiras.

Até penso que só para poder linkar postes de outros que muito gosto vale a pena ter um blogue.

Beijocas e pense nisso. Numa cool. Disparate é levar-se isto a sério. Ainda que defenda que se deva ser sério no que se manda para o ar.

Se não tivesse umas historietas para contar nunca escreveria. Não tenho talento e sei bem o que ele é.

(mesmo em relação a teses também penso que é mais fácil termos público a ler pedacinhos delas na net que a irem à biblioteca para as ler

ehehe

  • Antónimo

Porque dá muito trabalho e interessa-me pouco: conversa vou tendo por aí (por aqui). Mas há quem se ofenda: parece que, para se ter acesso à opinião cibernética, tem de se ter um blog. Parece que isso credibiliza o ciberpersonagem. É engraçado: a net recria rituais sociais do lado de cá – e alarga alguns a gentes que não teria acesso a eles no mundo de cá.

Devo, no entanto, confessar que namorei essa hipótese neste fim-de-semana: mas lemebrei-me e percebi que o que eu quero é só feedback e isso não se tem nos blogs – nem em lado nenhum. Lembrei-me da antecipação da partilha de ideias, da afirmação e da sua negação, das tranformações que essa dialéctica podia provocar, nas minhas ideias e nas dos outros – quando antecipei essa utopia (porque não teve lugar)? Quando defendi uma tese académica. Népia, zero, nada: cumpriu-se a função, o que implicou discutir uns cabelos púbicos e uns números de porta. E mais nada. A seguir vieram convites para publicar excertos e cumprimentos por inéditos que eu nem sabia que o eram. Ideias nada. Em lado nenhum: mas menos, ainda, nos blogs. O que eu vejo são palmadinhas nas costas e comentários do género gostei muito deste post (e eu quero lá saber que a genovev@20046 tenha gostado muito, se nem a conheço e se não tenho nenhuma consideração por gostos). E mandei o blog sobre cinema do Antónimo às urtigas. Palmadinhas nas costas até nem tenho muitas: mas quero cada vez menos.

Conversa tenho por aí (por aqui). E já há ciberpersonagens a quem me afeiçoei e respeito e lugarezinhos onde gosto de passar – alguns até demoradamente. É o caso da cocanha (que frequento diariamente no mundo de cá – sem luxos, só com preguiça). Hoje, estou melancólico: puxou-me ao discurso. Peço desculpa. O “convite” é simpático: agradeço. A simpatia agradeço sempre.

ó mas isaso interessa-me pois! vou já à procura. Muito obrigada Antónimo. Você é uma simpatia.

E ainda não me esqueci daquela análise do Demy…

vou fazer-lhe a pergunta tonta mas é verdade: por que não cria um blogue?

  • Antónimo

Acabei de ver isto, se calhar interessa-lhe:

“Sergio Vega, “Crocodilian Fantasies”
Sur les traces du livre El Paraiso en el Nuevo Mundo, écrit en 1650 par Antonio de León Pinelo, Sergio Vega poursuit sa quête d’un Eden en perpétuelle mutation. Une réflexion ludique et débridée sur le mythe du paradis perdu, de l’histoire coloniale et de leur contexte socio-économique” – no Palais de Tokyo.

Fantasias por fantasias, antes crocodilianas.

Cumprimentos.
Antónimo

Viva,Paulo!

pois é, mas os dragões são muito mais importantes e havia-os nos Paraísos do Oriente…
No outro dia, com aquele feito papagaio voador é que foi gaffe mas emendei com o Bruce Lee
ehehe
beijocas Paulo, aquele Calma Penada continua lindo
“;O)

Querida Zazie:
Obrigado por elucidares o Mundo acerca do bicharoco. Julgo perceber enfim o êxito dele nas carteiras de Senhora. Inconscientemente, surgia a associação: “se os excrementos me fazem jovem, o que não fará a pele?”.
Mas um passo me angustiou – creio que o nosso Amigo do Dragoscópio não gostará da confusão que relatas. Já o estou a ver a redigir um “post” fulminando a Idade Média.
Beijinho.

ora este merdinhas só dá prendas boas em forma de links!

thanks, era isso mesmo. A partir de dada alturas as coisas misturam-se todas e tanto se figuram lagartos voadores como crocodilos. Por isso é que não é muito acertado pensar-se sempre em representações naturalistas. Na maior parte dos casos continuam míticas. Mesmo em plena época das descobertas.

Quanto à desumana agradeço. Em VHS arranja-se mas, estupidamente, na versão restaurada que se apanha no e-mule tiraram a tinta…
e eu já tive a outra e perdi-a. Até tenho umas passagens dela nos arquivos.
Comprimi os ficheiros para gravar em cd e estragaram-se. E fiquei sem o original

“C’est alors que le merveilleux du Moyen Age semble se mêler aux sources antiques et le crocodile prend des allures de dragon”

croco

p.s Uma desumana tintada não tenho mas, se vier a ter ou souber dela, aviso.

“:O) vivo e a espernear no sítio onde está é que era cá uma coisa…

Obrigada Zazie. Sou uma verdadeira desconhecedora da crocodilos. E não sabia nada disto. é bom aprender num acaso, numa sexta-feira como outra qualquer, que se os crocodilos eram pendurados em igrejas, investidos ou não de carga simbólica. é mesmo muito engraçado. quanto ao segredo, sinceramente está tudo a passar-me ao lado, as dicas e pistas, lamento, “no comprendo”. Mas também só cá vim ver o crocodilo, e já estava morto.

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